Responsabilidade Digital: Até onde as empresas são responsabilizadas pelo conteúdo publicado por terceiros?

Você já deve ter se perguntado: e se alguém divulgar algo meu em uma rede social ou em um site de assinaturas, por exemplo, eu posso responsabilizar diretamente a empresa?

Essa é uma dúvida legítima e que, de fato, está prevista na legislação brasileira, especialmente no Marco Civil da Internet. A questão envolve a análise da responsabilidade dos provedores de aplicação, ou seja, das plataformas que geram ou hospedam conteúdos publicados por usuários, em face de conteúdos ilegais divulgados por terceiros.

O Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/2014) trouxe em seu texto uma série de normas e princípios que regem o uso da internet no Brasil, com enfoque nos direitos e deveres tanto dos usuários quanto das empresas que operam no ambiente digital. A partir dessa perspectiva, os artigos 19 e 21 do Marco Civil são fundamentais para a análise da responsabilidade dos provedores de aplicação de internet.

O artigo 19 define que, em regra, os provedores de aplicação não respondem civilmente pelo conteúdo gerado por terceiros. Esta responsabilidade apenas se configura, nos termos do dispositivo, quando, após ordem judicial específica, o provedor deixa de retirar o conteúdo ilegal do ar. Em outras palavras, a plataforma digital (seja ela uma rede social, um site de assinaturas ou qualquer outro serviço online) não responde automaticamente pelo conteúdo divulgado, a menos que uma ordem judicial determine a remoção, e essa remoção seja ignorada pela empresa. Essa norma reflete uma opção legislativa por um modelo de responsabilidade subjetiva, onde a inércia em atender à ordem judicial é o que configura a ilicitude.

O objetivo do artigo 19, portanto, é proteger a liberdade de expressão e evitar a censura prévia, assegurando que as plataformas não sejam compelidas a monitorar preventivamente o conteúdo publicado por seus usuários. No entanto, esse artigo tem gerado amplos debates e questionamentos, especialmente em situações onde o conteúdo é claramente ofensivo, calunioso ou invasivo de direitos, como ocorre em casos de difamação, divulgação de imagens íntimas ou violação de direitos autorais.

Por outro lado, o artigo 21 do Marco Civil estabelece um regime de responsabilidade diferenciada para casos específicos, como a divulgação de imagens, vídeos ou outros materiais contendo nudez ou atos sexuais de caráter privado sem o consentimento da pessoa retratada. Nesses casos, o provedor de aplicação é obrigado a remover o conteúdo após simples notificação da vítima ou de seu representante legal, dispensando-se a necessidade de ordem judicial. Esse dispositivo visa proteger a privacidade e a dignidade da pessoa humana, entendendo que, em casos de grande violação da intimidade, a resposta deve ser imediata, sem entraves burocráticos.

Assim, sob a ótica do Marco Civil da Internet, a responsabilização dos provedores de aplicação está atrelada à natureza do conteúdo publicado e ao cumprimento dos procedimentos de remoção. Para conteúdos difamatórios, ofensivos ou que violem direitos gerais de personalidade, a responsabilidade só surge após a desobediência a uma ordem judicial de remoção, nos moldes do artigo 19. Já nos casos envolvendo imagens íntimas ou material sexual privado, o artigo 21 facilita a proteção da vítima ao prescindir de uma ordem judicial, bastando a notificação.

Esse equilíbrio legislativo entre proteção da liberdade de expressão e responsabilidade pela remoção de conteúdos ilegais é um ponto de contínua evolução e análise, especialmente diante das demandas por maior proteção contra abusos online.

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